Novo Trem Série 8000 da CPTM |
A estatal paulista CPTM gastou cerca de R$ 2 bilhões para comprar
48 trens em 2008 e 2009 sem fazer pesquisa de preços, como exige a
legislação, segundo despachos do Tribunal de Contas do Estado de São
Paulo.
Os trens foram adquiridos durante o
governo do tucano José Serra (2007-2010). A companhia espanhola CAF venceu as duas licitações.
Foi numa dessas licitações que Serra disse ter obtido um dos melhores
preços de trens da história.
A pesquisa de
preço é exigida por duas leis: a das licitações, de caráter federal, e
um decreto estadual. É a partir do levantamento que as empresas públicas
estabelecem o valor de referência, que costuma ser o preço máximo nas
licitações.
A exigência tem uma razão simples:
sem a pesquisa não dá para saber como se chegou ao valor de referência.
Numa analogia simplória, seria como estimar o preço de um muro sem
pesquisar quanto custa o tijolo. São os documentos com esse levantamento
que o Tribunal de Contas não achou.
Trens da CPTM comprados da empresa espanhola CAF, na estação da Luz, no centro de São Paulo
"(...)
Não há, nos autos, documentos evidenciando a necessária pesquisa de
preços", escreveu a conselheira do TCE Cristiana de Castro Moraes, em
despacho sobre a compra em 2008 de 40 trens. Ela fez a mesma observação
sobre a aquisição de oito trens no ano seguinte. Os dois casos ainda não
foram julgados pelo tribunal.
A CPTM diz no
processo ter trabalhado com "orçamento estimativo", baseado em preços de
compras anteriores. O Tribunal de Contas já condenou o método por duas
razões: 1) não há garantia que o preço antigo tenha sido o mais
vantajoso; e 2) o valor precisa refletir o que ocorre na época da
concorrência.
As compras foram financiadas pelo
Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento. Ambos não
responderam se o orçamento foi aprovado sem pesquisa de preços.
A
Corregedoria Geral da Administração paulista, que investiga supostas
irregularidades de funcionários públicos em cartel denunciado pela
Siemens, aponta o engenheiro Osvaldo Spuri –que foi presidente da
comissão de licitação nos dois casos– como suspeito pela inexistência de
pesquisa de preços. Hoje, ele é secretário de Infraestrutura Urbana da
prefeitura de São Paulo. O tucano foi escolha pessoal do prefeito
Fernando Haddad.
Spuri diz que "é
impossível" calcular o preço de todos os componentes de um trem, como
exige a lei das licitações. O artigo 7º da lei diz que deve "existir
orçamento detalhado em planilhas que expressem a composição de todos os
seus custos unitários".
Ele diz que as
estimativas de preço para as compras de 2008 e 2009 foram obtidas em
pesquisa feita em 1994 pela CPTM, que chegou ao valor de US$ 2,4 milhões
por carro. Só um consórcio apresentou proposta naquela licitação.
Preços
posteriores seguiram esse padrão, segundo o engenheiro. Na licitação
para compra de trens da linha 5 do Metrô, por exemplo, o preço do carro
foi de US$ 2,36 milhões (R$ 5,64 milhões, pelo câmbio atual), mesmo
valor usado nas compras da CPTM.
Claudio Weber
Abramo, diretor-executivo da Transparência Brasil, que acompanha as
apurações da corregedoria, diz que o método usado para a compra de trens
"tem dois defeitos gravíssimos": "O primeiro é que perpetua um possível
superfaturamento, pois nada garante que o preço de US$ 2,4 milhões por
carro ofertado por uma única empresa em 1994 tenha sido razoável".
O
segundo defeito, diz ele, é que o preço antigo não contempla evolução
tecnológica com barateamento de componentes, mudanças cambiais e o
aumento no número de empresas concorrendo.
Outro lado
A
CPTM e o ex-presidente da
comissão de licitação da estatal Osvaldo Spuri disseram que o orçamento
para a compra dos 48 trens em 2008 e 2009 foi baseado em valores de
compras passadas.
Em nota, a CPTM afirma que a
fixação dos preços das licitações "ocorreu por meio de estimativas com
base em contratações anteriores e informações coletadas junto ao mercado
e aos organismos multilaterais de crédito".
A
companhia ressalta que compras de trens "possuem configurações
particulares decorrentes das necessidades operacionais de cada
adquirente" que repercutem no preço final do produto. Osvaldo Spuri diz
que "só existe estimativa de mercado ou referência em compras
anteriores".
Bancos
A
Folha indagou ao Banco Mundial e ao BID se as instituições aprovaram as licitações de 2008 e
2009 da CPTM mesmo sem a existência de documentos que mostrem como foi
formado o preço das concorrências. Os bancos não responderam à questão.
Em
nota enviada à Folha sobre as licitações da CPTM, o Banco Mundial
afirma de forma genérica que "não tem ingerência, nem autorização legal
sobre documentos de propriedade do mutuário, neste caso a CPTM e o
Governo do Estado de São Paulo" e "tem regras próprias rígidas de
contratação e supervisão dos contratos que contam com o seu
financiamento".
Procurado pela reportagem na
noite de ontem, o ex-governador de São Paulo José Serra não retornou aos
telefonemas até o fechamento desta edição.
Fonte da Notícia: Folha de São Paulo
Imagem: CPTM
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