O Ministro Rogério Schietti Cruz, do Superior Tribunal de Justiça, suspendeu liminarmente a tramitação de um mandado de segurança do
Tribunal de Justiça de São Paulo que garantia o recebimento de denúncia
e consequente abertura de ação penal contra 12 executivos de quatro
multinacionais acusados por formação de cartel no setor
metroferroviário. A medida atende pedido de habeas corpus de um dos
alvos da investigação, o executivo Albert Fernando Blum.
Na prática, a ação fica parada até que o mérito do habeas corpus seja
julgado pelo STJ. A Procuradoria-Geral de Justiça em São Paulo estuda
recorrer. O Ministério Público paulista alerta que outros denunciados
por cartel poderão seguir o mesmo caminho.
O caso que chegou ao STJ é referente ao projeto Linha 5-Lilás do Metrô,
contratado em 2000 pela CPTM ao preço de R$ 1,2 bilhão.
Em Março de 2014, a Promotoria entregou à Justiça cinco denúncias contra o cartel, acusando 34 dirigentes de 12 empresas.
A ação do projeto Linha 5 foi distribuída para a 7.ª Vara Criminal,
mas o juiz Benedito Roberto Garcia Pozzer rejeitou a denúncia por
entender que houve extinção de punibilidade dos acusados pela prescrição
das penas dos crimes a eles atribuídos. O juiz entende que o cartel é
caracterizado por “crimes instantâneos de efeitos permanentes”.
A Promotoria foi ao TJ com recurso em sentido estrito para afastar a
incidência da prescrição. Também entrou com mandado de segurança e
obteve liminar que mandou o juiz da 7.ª Vara receber a denúncia. Contra
essa decisão do TJ paulista, os advogados do executivo Albert Blum foram
ao Superior Tribunal de Justiça com pedido de habeas corpus alegando
“ocorrência de constrangimento ilegal”.
A defesa de Albert Blum argumentou “impossibilidade jurídica do
pedido (da Promotoria)”. Os advogados salientam que “criou-se uma
incompatibilidade lógico-jurídica, consubstanciada na tramitação
simultânea da ação penal”. No mérito, a defesa pleiteou o trancamento do
mandado de segurança.
Com a ordem do ministro do STJ, o mérito do mandado de segurança do
Ministério Público só poderá ser decidido após o julgamento do habeas
corpus impetrado perante a Corte por Albert Fernando Blum.
O Gedec, braço do Ministério
Público paulista que combate cartéis, calcula que o prejuízo causado aos
cofres públicos com a celebração de cinco contratos entre os anos de
1999 e 2010 (governos Mário Covas, José Serra e Geraldo Alckmin, todos
do PSDB) gira em torno de R$ 850 milhões, ou 30% do montante dos
contratos.
O cartel no setor metroferroviário de São Paulo e do Distrito Federal
foi revelado pela multinacional alemã Siemens em acordo de leniência
firmado em maio de 2013 com o Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (CADE), órgão antitruste do governo federal.
Uma das cinco denúncias do Ministério Público de São Paulo foi
distribuída para a 7.ª Vara Criminal da Capital. Nela, o promotor
Marcelo Mendroni apontou conluio no projeto da Linha 5 do Metrô e acusou
12 executivos de quatro empresas.
O contrato da Linha 5 Lilás foi fechado em agosto de 2000. Para o
juiz da 7.ª Vara Criminal a prescrição ocorreu em 2012. Benedito Pozzer
entende serem “os crimes instantâneos de efeito permanente”.
Mas o promotor Mendroni sustenta que “o crime de formação de cartel
é, à evidencia, um crime formal de natureza permanente, e não um crime
material instantâneo, de efeitos permanentes”.
Mendroni entrou com recurso em sentido estrito no Tribunal de Justiça
de São Paulo para que fosse afastada a prescrição. Diante do risco de
que os crimes viessem mesmo a prescrever em curto prazo, o promotor
impetrou mandado de segurança no TJ, por meio do qual pediu o imediato
recebimento da denúncia.
O TJ concedeu parcialmente a liminar no mandado de segurança e
determinou à 7.ª Vara Criminal o recebimento da denúncia para
prosseguimento da ação penal.
O relator do habeas corpus no STJ, ministro Rogério Schietti,
considerou em liminar que o Ministério Público fez pedidos idênticos nos
dois instrumentos “com a intenção de utilizar o mandado de segurança
para atribuir efeito suspensivo ao recurso contra o reconhecimento da
prescrição”.
“A jurisprudência desta Corte é firme no sentido do não cabimento de
mandado de segurança para conferir efeito suspensivo a determinado
recurso que não o possui”, alertou o ministro Schietti.
O ministro concedeu a liminar no dia 17 de junho, “com o que ficou
suspensa a liminar do Tribunal de Justiça de São Paulo no mandado de
segurança”. No dia 25 de junho, o ministro deferiu a extensão da liminar
para suspender a tramitação do mandado de segurança até o julgamento do
habeas corpus.
O promotor Mendroni alerta que “se foram cancelados os efeitos da
liminar (no mandado de segurança por ele impetrado no TJ) e o processo
voltar para a fase anterior ao recebimento da denúncia a prescrição pode
ocorrer antes do julgamento do mérito”.
“A situação jurídica que decorrer do caso é mesmo lamentável”,
adverte o promotor de Justiça. “Pode levar à verdadeira ocorrência da
prescrição. O Ministério Público fica de mãos atadas.” Mendroni não tem
atribuição para atuar no Superior Tribunal de Justiça, por isso
encaminhou o caso para a Assessoria Jurídica da Procuradoria-Geral de
Justiça.
Com a palavra, a defesa
Os advogados Renato Stanziola Vieira e André Pires
de Andrade Kehdi, que representam o executivo Albert Fernando Blum e
ingressaram com o pedido de habeas corpus no Superior Tribunal de
Justiça, argumentam que não se pode atribuir à defesa o eventual risco
de prescrição dos crimes atribuídos aos denunciados por cartel. “A
denúncia só veio agora. Se houve demora a culpa não é dos denunciados,
não mesmo”, reage Stanziola.
“A prescrição não pode ser atribuída aos acusados”, pondera o
advogado. “O Ministério Público teve, no mínimo, de 10 a12 anos, para
fazer investigação.”
Stanziola e seu colega de escritório, André Kehdi, enalteceram a
decisão do ministro Rogério Schietti Cruz, do STJ. “Nós realmente
acreditamos que a decisão é extremamente positiva, porque resgata uma
jurisprudência garantista do STJ, conhecida de mais de 10 anos, portanto
é salutar”, eles observam. “A decisão veio em boa hora e muito bem
concluída.”
Para Stanziola, a decisão do STJ que acolheu os argumentos do habeas
corpus para Albert Blum deve ser estendida a todos os outros 11
denunciados no caso do Projeto Linha 5-Lilás do Metrô.
Stanziola pondera que a ordem do STJ “não deve ser lamentada pelo
Ministério Público de São Paulo pelo simples fato de que ela (a decisão)
recoloca o caso nos trilhos adequados”. Para ele, a liminar em mandado
de segurança obtida pelo Ministério Público no Tribunal de Justiça de
São Paulo criou “situação esdrúxula”.
O próximo passo dos defensores do executivo será “pura e
simplesmente, como a lei prevê, responder ao recurso do Ministério
Público”.
“Vamos obedecer rigorosamente todos os trâmites que a Justiça
determinar. Esse foi só um pedaço da discussão jurídica que vai ser
levada em conta. Havia um contra senso lógico insuperável. Esperamos que
o STJ corrija isso quando apreciar o mérito do habeas corpus,
recolocando os trens nos trilhos.”
Fonte da Notícia: Estadão
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