Trens velhos ainda circulam diariamente na CPTM |
A rede da CPTM, com cerca de 260 km, atendendo 22 municípios, com
mais de 80 estações, aproximadamente 170 trens e movimentação de quase 3
milhões de usuários em média por dia útil apresenta não só números
superlativos, mas também descaso em igual ou superior escala. A capital
possui cerca de 130 km (136,5 km, para ser mais exato, de acordo com a Secretaria dos Transportes Metropolitanos),
o que é mais do que a rede do Metrô inteira, mesmo se somarmos a Linha
4, operada pela CCR ViaQuatro em regime de concessão patrocinada).
Mesmo com mais de 100 km dentro da capital, mesmo atendendo a espécie
de “centro nervoso” que se tornou a região da Marginal Pinheiros, mesmo
interligando o ABC e a capital, mesmo atendendo à Zona Leste com o
único serviço expresso sobre trilhos de toda malha, continua sendo
tratada como cidadã de segunda classe. E o pior: o tratamento
questionável está por todos os lados, de utilizadores a jornalistas e
até supostos especialistas, contaminando o viés político que qualquer
obra de infraestrutura feita por um órgão estatal carrega por natureza.
Enquanto os holofotes se voltam apenas ao Metrô, a requalificação da
malha da CPTM, que já chegou a prever trens de quatro carros e
intervalos (na época) teoricamente baixos, continua se arrastando a
medida que a demanda não para de aumentar, com um modelo operacional que
parece ter se adaptado às pressas a uma realidade que não havia sido
prevista, para variar, subestimou-se os subúrbios e sua demanda de
passageiros, talvez isso explique o sepultamento do Projeto Integração
Centro.
O corredor do Integração Centro na Estação Luz saturou, a integração
na Estação Santo Amaro continua sendo motivo de estresse para usuários
das linhas 5-Lilás e 9-Esmeralda (originalmente se previa a conexão em
uma outra estação, chamada de João Dias, que apesar de perder a
intermodalidade, vez ou outra é citada pela imprensa,
a ingerência em relação a obras de infraestrutura e contratos de
prestação de serviços atingiu níveis críticos, reduzindo a
confiabilidade do sistema, fazendo com que os novos trens revelassem a
falta de capacidade administrativa da CPTM em se modernizar sem
abandonar as próprias raízes. Nada disso, porém, parece despertar
fortemente o interesse da chamada “grande mídia”, aquela que ataca
apenas os sintomas do transporte público ao passo que anúncios de carros 1.0 com prestações a perder de vista
são convenientemente vomitados nas telas e páginas. Mesmo nas denúncias
de cartel o enfoque continua sendo dado ao Metrô, sendo que contratos de
manutenção de pelo menos três séries de trens da CPTM fazem parte
daquilo que vem sendo popularmente apelidado de propinoproduto.
De acordo com o jornal Folha de S.Paulo, os intervalos de 3 minutos
são prometidos desde o governo Fleury, é o que revela trecho de matéria
publicado em 15 de setembro de 1991 (a edição em questão pode ser
buscada no acervo em http://acervo.folha.com.br/),
na época, o governador em questão já prometia intervalos de 3 minutos e
a mesma qualidade do Metrô para o transporte suburbano, no mesmo
parágrafo, a declaração do governador fazia parecer que os intervalos
eram de 8 minutos, o que estava longe de ser verdade para as linhas
Tronco e Variante, atuais 11-Coral e 12-Safira, por exemplo, que
apresentavam um intervalo praticamente dobrado em relação ao declarado.
Os mesmos intervalos são prometidos até o dia de hoje, no portal G1, em matéria do dia 11 de abril de 2013,
o mesmo intervalo foi prometido, ironicamente e assim como na Folha de
1991, o leitor foi induzido a erro, pois nem todas as linhas da CPTM
operam com 5 minutos de intervalo no horário de pico, também não foi
implementado, até os dias atuais, uma forma de acompanhamento dos
intervalos, com os horários entre uma e outra composição, item
primordial ao meu ver.
Enquanto a imprensa alimenta inconsequentemente comparações
infundadas com sistemas de metropolitano centenários, pelo menos
parcialmente construídos ao custo de muita mão de obra trabalhando em
condições sub-humanas e inseridos em um contexto econômico, social e
urbanístico totalmente distintos em relação ao cenário paulista, a mesma
imprensa também comete gafes imperdoáveis ao considerar sistemas de
metrô comparáveis a CPTM em termos de intervalo, com padrão de serviço
inferior ou similar, ao mesmo tempo que parece desclassificar ou não
enxergar a CPTM. Ademais, as requalificações feitas no trecho
Mauá-Pirituba da então Estrada de Ferro Santos-Jundiaí são sempre
ignoradas (atualmente o trecho é das linhas 10-Turquesa e 7-Rubi), bem
como a modernização dos serviços de subúrbio da Fepasa nas linhas Oeste
(atual 8-Diamante) e Sul (9-Esmeralda), o que só enfraquece uma análise
mais coesa sobre a situação de toda a rede de trilhos, mesmo no antigo
sistema Leste (linhas Tronco e Variante), estações foram reconstruídas
(é o caso de Suzano, Ferraz de Vasconcelos, Mogi das Cruzes, da antiga
São Miguel Paulista etc), para não dizer que o processo de chegada do
próprio Metrô à Zona Leste remete a diversas questões, inclusive ao fato
de que a região de Itaquera não recebeu os devidos cuidados previstos,
tema este que exploramos brevemente aqui no Via Trolebus ao falarmos de
uma tese de mestrado da USP, tese esta que é uma leitura recomendada para quem quiser entender mais um pouco sobre a delicada questão da
Linha 3-Vermelha, vale lembrar, outrossim, que a chegada da Linha 3
causou alterações no viário (a Radial Leste fala por si só), mudanças
nos ônibus (nunca a Zona Leste recebeu tantos terminais de ônibus) e,
principalmente: aproveitou parte da faixa de domínio da Linha Tronco,
algo que até os dias atuais provoca contraste, positivo e negativo,
entre a Linha 3 e os trens do Expresso Leste da Linha 11-Coral da CPTM.
Requalificação é elemento-chave
A verdadeira requalificação da CPTM é de fundamental importância para
uma melhora substancial na vida de pelo menos uma parcela significativa
que vive na metrópole, mesmo que apenas a trabalho.
O projeto do expresso entre a sub-região Oeste da Região
Metropolitana e a Zona Oeste da cidade de São Paulo, alterando a vida de
quem utiliza as linhas 8 e 9, por exemplo, é muito pouco discutido
nele, um trem expresso com paradas nas estações Barueri, Carapicuíba e
Osasco vai direto para a Estação Pinheiros, terminal do serviço. O
projeto também esbarra com outra mudança: a da Linha 9 passar fazer
terminal na Lapa, se conectando às linhas 7 e 8, algo que remete assim
como o próprio Expresso Oeste-Sul ao ano de 2011, já falamos sobre a
possibilidade da Lapa “unificada” incluir a Linha 9.
Outra mudança que foi anunciada e que caiu rapidamente no
esquecimento foi aquela voltada ao saturado corredor da Estação da Luz,
não só nada mais se falou com relação a aberturas de mais saídas e de
uma conexão com a subutilizada Estação Júlio Prestes da Linha 8, como
também não se observou qualquer esboço por parte da CPTM de pelo menos
remover os esqueletos das antigas lojas de conveniência que existiam em
parte da área subterrânea, o jovem corredor de integração, hoje com
apenas dez anos de idade, assim como a Linha 9, se viu em situação ainda
mais complicada assim que a Linha 4 começou a ganhar popularidade.
Aqueles que conhecem a integração da Linha 4 na Estação Luz nos horários
de pico provavelmente entendem muito bem o significado da palavra
gambiarra; não se optou por alargar a galeria e confeccionar uma
integração digna, que resgatasse a elegância do comércio que existia,
facilitasse a integração e acomodasse melhor o fluxo de passageiros
oriundo não somente da realidade atual, mas também de pelo menos mais
duas ou três décadas, apenas se criou uma abertura e um redirecionamento
de fluxo bruto e inconveniente.
Um projeto maior e que teoricamente permite a eliminação de gargalos
operacionais históricos é aquele da Fupam. O projeto da Fupam leva o
nome de Tronco Metropolitano da Mobilidade Urbana, dando um tom de vida
própria ao trecho dentro da abrangência do projeto, em que as linhas são
vistas como articuladoras importantes, não meras alimentadoras do
Metrô.
O projeto da Fupam, ainda que não totalmente maduro, é interessante
por explorar um dos eixos mais cruciais de parte da rede da CPTM, que
vai do Brás até a Lapa, identificando pontos de interesse e/ou de
relevância ao longo do trajeto, a medida que intervenções urbanas no
entorno imediato se desdobram, ou seja, é um projeto que viabiliza uma
requalificação urbana talvez comparável com as obras realizadas pela
França na então inédita RER (Rede Expressa Regional), com estações
subterrâneas estratégicas em Paris, alterando a experiência de
utilização dos serviços de subúrbios, o emprego de uma perfuratriz e a
modernidade e sofisticação do sistema marcaram uma matéria da revista
Popular Science a respeito, datada de agosto de 1972.
O projeto prevê a existência de cargueiros e é provavelmente uma das
propostas mais arrojadas feitas até o momento para a requalificação da
CPTM. Humildemente, especulo que levar a Linha 11 até a Estação Lapa
poderia mudar o cenário da Estação República e também ajudar a
fortalecer ainda mais o tronco proposto, eu diria que as possibilidades
são tamanhas, de maneira que é possível repensar também a questão da
Linha 12-Safira, hoje confinada na Estação Brás, além da Linha 13-Jade,
que vem ganhando certa notoriedade em vista do anúncio para início das obras,
acredito que a conexão em Brás, provavelmente uma das piores em todo o
sistema poderia ter seu uso completamente alterado, o que beneficiaria
diretamente a Linha 3, hoje o Brás é sem dúvida alguma uma das paradas
mais críticas da linha, quando os trens já abarrotados têm os
passageiros colocados a prova, sendo várias as cenas de desrespeito no
embarque.
Extrapolando o termo “metrô”: urbano e regional
Inserido nas entrelinhas do presente texto, o termo “metrô” ainda
causa confusão entre algumas pessoas. Na Revista Engenharia 607, o
especialista Peter Alouche fala de metrô regional e metrô urbano e,
ainda que as características possam se confundir em diversos momentos, é
uma maneira muito mais simples de tratar o transporte pesado sobre
trilhos em São Paulo. O trecho relevante do artigo do Peter, segundo ele, a CPTM é um sistema de metrô regional, o que
faz absolutamente sentido, é sinônimo também do termo “metrô regional”
um que vem caindo em desuso, inclusive pela própria CPTM: “trem
metropolitano”, são duas palavras que consagraram a modernização
promovida pela Fepasa e a CPTM é a Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos.
Como tentei mostrar, ao limitarmos virtualmente o campo de atuação de
um sistema de transporte, limitamos também sua importância, não só em
termos políticos, mas também sociais. A requalificação e modernização
definitiva da CPTM inclui mais do que máquinas e procedimentos
operacionais, ela está ligada intrinsecamente ao aspecto humano,
relacionado aos empregados e também aos usuários. Acelerar o processo
depende fortemente da forma como o sistema é percebido, podemos estar
perdendo uma grande oportunidade e quando nos dermos conta, os custos e
as dificuldades poderão ser ainda maiores.
A VELHA SENHORA. DE SEGUNDA A SEXTA AS 18:00 NO BLOG JORNAL DA CPTM. www.jornaldacptm.blogspot.com.br E TAMBÉM NO NOSSO FACEBOOK
O BLOG JORNAL DO METRÔ ESTÁ DE CARA NOVA. CONFIRA www.jornaldometro.blogspot.com.br
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